quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

O cineasta

Não tinha visto o vídeo de Paris Hilton, nem o de Cicarelli. Vira, na pré-adolescência, o de Pamela Anderson, numa concorrida fita vhs que um amigo tinha trazido do intercâmbio nos Estados Unidos, junto aos bonés do Mickey e bonecos articulados. Não sabia quem era Júlia Paes nem Márcia Imperator. Gretchen, para ele, era uma cantora (sic). Rita Cadillac, uma chacrete das antigas.

Pois, agora, conhecia Júlia Paes, Márcia Imperator, e uma penca de outras moças e rapazes. Descobrira outras atribuições de Gretchen e Rita Cadillac. Depois de anos de faculdade, investimentos pessoais, cursos, trabalhos em mostras de realizadores renomados, estágios em longas de prestígio, dois curtas de boa repercussão no currículo, via-se ganhando bem, muito bem, fazendo cinema pornô.

Tinha começado meio sem querer. Vencera um pitching para um programa num canal por assinatura. No meio da produção do piloto, o comando do canal achou o programa muito forte para o perfil do público, e repassou-o para outro canal do mesmo grupo, de conteúdo adulto. Fez o programa e agradou, acabou fazendo mais dois. Daí, recebeu o convite para sair do mundo erótico chic e entrar no pornô.

Começou claudicante, queria trama, história, travellings, atuações. De cara já foi esculachado pelos produtores. Passou para o bê-a-bá e ganhou mais credibilidade. Seu diferencial era a exploração da sensualidade, antes da consumação do ato. O que muitos viam como enrolação, ele via como atração. As preliminares do pornô, que não eram necessariamente as preliminares do sexo. Investia numa sugestão sexual, num certo mistério, pra depois a coisa rolar por completo.

Apesar de umas torcidas de nariz, levou adiante seu intento e conseguiu amealhar muito sucesso. Que era igual a dinheiro, na verdade. Uma vez foi na pré-estréia do filme de um colega da faculdade. Encontrou muita gente. Nem todos sabiam da sua ocupação atual. Apesar de rico, tinha alguma frustração por não fazer o que queria. Também não desejava fazer o que queria e viver num kitchnet apertado e andar de ônibus.

Na verdade, não sabia. Via seu colega ali, em cima do palco, anunciando todo orgulhoso seu longa-metragem. Podia nem ser bom. Mas via que o orgulho que o colega sentia ali em cima era genuíno. Isso ele não tinha.

Pegou um vôo naquela mesma noite e foi recuperar-se da melancolia com um passeio de uma semana em Fortaleza num resort em Jericoacoara. O dinheiro comprava algum orgulho, no fim das contas. Foi pensar nos prós e contras de sua vida num passeio de barco. Precisava se convencer de que, no fim das contas, estava feliz.

3 comentários:

  1. Sua leitora mais fiel quer que você atualize isso aqui!

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  2. Por isso que, quando disse ao meu pai que faria cinema na facul, ele me indagou: "Sacanagem, né?".

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