quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Velhice

Estava totalmente sem preparo físico. Nem de longe parecia o atleta que já fizera travessia a nado e que, seguidamente, completava a maratona. Um incômodo no joelho esquerdo lhe fazia boicotar a corrida. Uma queda, há alguns anos, numa calçada de pedras portuguesas meio soltas, lhe havia fraturado a bacia. Não tinha certeza, mas achava que ainda fazia um barulhinho irritante quando levantava a perna a partir de certa altura.

Estava mesmo velho.

Tinha um pouco de preguiça - e bastante medo - de ir ao médico. Os médicos sempre pareciam ver o pior nas situações, acreditava. Já iam mandá-lo fazer cirurgia, usar muletas. Se pegasse um açougueiro, capaz de querer metê-lo numa cadeira de rodas de vez. A preguiça era de lidar com isso tudo, convencê-los do contrário, argumentar com a família assustada e, por fim, desobedecer a todos. A rabugice justificada pela velhice lhe servia de salvo conduto para agir como quisesse.

O medo era de que eles estivessem certos. Todos. Em tudo.

Então ficava nesse dilema. E, enquanto isso, doíam o joelho e a cintura, que imaginava ser sequela do tal problema da bacia. Dor de velho. Era melhor ficar velho que ficar doente.

Desistiu dos exercícios. Comprou uma poltrona reclinável. Colocou na sala. Sentou-se, era a maciez que se imaginavam as nuvens. Reclinou-se, como se o próprio Deus lhe repousasse as costas nas mãos. Com o controle remoto, ligou a TV. A cabo. Futebol, seu time. E ganhando.

Nesse momento de paraíso pleno em si mesmo, pediu à esposa, com quem estava casado há 43 anos, uma cerveja. E podia morrer assim, sem nenhum diagnóstico desenganador, só com umas dores típicas da idade. Esse diagnóstico era dele mesmo, e bastava.

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