segunda-feira, 16 de março de 2009

Retorno

Esteve ausente por um longo período. Passou por muitos lugares, quase todos bem longe dali. Conheceu pessoas, fez amizades, fez amor, fez inimigos, fez vontades e não fez muitas coisas das quais se orgulhasse. Talvez por isso estivesse voltando. E porque não tinha para onde ir.

Não sabia como iam reagir à sua volta. Achava que sua mãe ficaria feliz. Está no código genético das mães. Seu irmão iria lhe virar a cara. Seu pai, pouco lhe importava. Era como ele, e por isso um não tolerava o outro.

Os vizinhos talvez se incomodassem com a presença dele ali. Já não causava muita empatia quando estivera ali antes, quem dirá agora, depois de tudo. Se a notícia se espalhasse, certamente haveria represálias. Gente da redondeza querendo tirá-lo de lá. Iam acusá-lo, até, de desvalorizar o bairro. Aquele bairro imundo onde nascera e vivera tanto, e, ao mesmo tempo, tão pouco. Aos que sobreviviam naquele antro, a indiferença.

Chegou à rua com o sol nascendo. Reconheceu tudo como havia deixado anos antes, e isso lhe entristeceu. Sua casa só tinha as paredes mais descascadas. Alguns brinquedos de criança no quintal talvez evidenciasse novidades. Olhou o portão de ferro bambo. O velho cão olhava fixamente para ele por entre as madeiras da cerca. Não sabia se o cão não o reconhecia, ou o ameaçava. Será que até o cão lhe recriminava?

Olhou as janelas fechadas. Abstraiu-se no silêncio da manhã. As casas germinadas da vizinha; o sobrado e a série de casas sem reboco que iam até o fim da rua sem saída, um muro com dizeres ilegíveis, que ele mesmo havia pixado. Ainda ali. Só ele sabia o que estava escrito. Olhou com mais força e as manchas de sangue no muro tinham secado, mas não sem deixar sua marca gravada no concreto, como quem se recusasse a esmanecer jamais.

Recolheu-se, deu meia volta e desistiu de retornar àquela realidade na qual ele ainda se fazia presente. Em espírito e nas marcas indefectíveis que deixara. Esse fardo ele fizera todos carregarem ali, e que ele carregara com ainda mais pesar em seus anos na prisão. Não poderia sair de uma e entrar em outra. Ali, ninguém esqueceu.

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