quinta-feira, 4 de junho de 2009

Luto

Veio enterrar o pai. Doze horas de vôo, oito horas em terra, quatro delas num cemitério, e outras doze horas no ar. Seu pai vinha doente, um câncer de esôfago que havia se propagado para vários outros órgãos. Metástase constatada, o médico lhe dera três meses. Com um, a internação severa. Não duraria dias.

Então ele voou no primeiro avião. Pagou a tarifa mais cara de um dinheiro que não tinha. Precisava enterrar seu pai.

Chegou de manhã cedo. A morte acontecera quinze minutos depois que ele havia entrado no avião e desligado o celular. Ao pousar, foi recebido pelo motorista da família. Era o primeiro sinal. Com o percurso diferente do habitual, percebera sozinho a verdade que o motorista não se sentia à vontade para lhe contar. Foram direto para o cemitério. O velório acontecia desde a noite anterior. A família estava reunida, à sua espera.

Tinha prometido que não iria retornar somente nesta situação, quando saiu. Mas não conseguiu cumprir a promessa. Parte por sua culpa e inesgotável afã pela carreira; parte pela teimosia do pai em apressar esse momento nuns bons cinco ou dez anos, fumando dois maços por dia desde a mocidade.

Recebeu as condolências com inegável educação e velado constrangimento. Não reconhecia quase ninguém após tantos anos, e sentia, além da tristeza pela perda, uma dor de certa culpa. Como se uma silenciosa inquisição o condenasse por ter abandonado a família, a cidade, o país.

Até que sua mãe pegou em sua mão e enconstou-a contra o próprio peito, e ele sentiu aquele coração cansado bater mais forte naquele momento de dor. A mãe estava enlutada à alma, mas um fiapo de luz surgia num sorriso quase imperceptível de quem revê o filho após muito tempo, sem importar o porquê.

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